SAUDADE...
Saudosos tempos em que frequentava a USP, quando era ainda na Rua Maria Paula. Eu morava numa pensão, logo no início da Major Sertório, que ficava a meia quadra da faculdade. Éramos em quinze moças, que estudavam ou trabalhavam.
Eu dividia o meu quarto com duas queridas amigas e havia um só banheiro para tantas mulheres e todas saiam cedo. Imaginem o tamanho da fila, no banheiro de manhã, não de pessoas, mas de saboneteiras, porque quem levantava mais cedo colocava logo a sua saboneteira ou chinelo na fila enquanto se ocupava de outros afazeres. Eu sempre levantava cedo, para pegar o lugar antes da Tereza, uma pernambucana linda, que trabalhava logo cedo e demorava demais no banheiro. Era uma glória usar o banheiro antes dela.
Uma das meninas com a qual partilhava o quarto, também fazia o curso de Letras Clássicas, como eu, e morava em Franca. Éramos amigas de todas as horas e conversávamos sobre tudo, principalmente sobre religião ( eu era espírita e ela católica), filosofia, sonhos, amores, tudo. A nossa amizade resiste até hoje e, embora não possamos nos ver com frequência, falamos sempre por telefone.
A Sylvia (era esse o seu nome) era uma menina linda e demorava demais para se arrumar, olhando-se no espelho, mudando de roupa várias vezes, sempre procurando uma aparência que a satisfizesse.
E eu sempre “pegava no seu pé”, recriminando-a por ser muito vaidosa. E ela sempre se saía com essa: “Não é vaidade, é caridade”. E ficávamos por aí, porque eu não queria discutir.
Mas um dia eu a interpelei firme, dizendo: “Que história é essa de caridade”
_”Pois não é? Eu me faço bonita para o bem das pessoas, para que elas se alegrem com a minha visão, fiquem felizes”
Eu pensava a respeito e acho que até cheguei a me convencer de que ela tinha razão.
Há algum tempo atrás, falando com ela pelo telefone, lembrei-a destes episódios, a que ela me respondeu:
“Não era caridade nada. Era vaidade mesmo. Eu me enganava e enganava aos outros. Custei para perceber isso. A vida me ensinou!”
Será? A dúvida ficou ainda em mim