As religiões e os corações...
Hoje lembrei-me de um fato importante, que também nos ensinou muito...
Quando se decidiu no Centro Espírita Caritas fundar um Lar para velhinhos, começamos a arrecadar fundos. Abriu-se um Livro de Ouro para contribuições e eu, a Jacy, e a Ester Lopes, companheiras da casa saímos à rua para solicitar ajuda de pessoas que pudessem e quisessem contribuir.
Eu fui, muito destemida, logo em primeiro lugar, pedir ao Bispo de Mogi das Cruzes, uma contribuição para o futuro Lar de Velhinhos, de um centro espírita. A Ester, que era muito pudica, ficou apavorada e dizia: “Mas pedir logo ao Bispo?”
E eu, toda convencida, dizia: “Sim, senhora, ao Bispo”. Só que ela não sabia ainda que o Bispo era meu amigo, frequentava a minha casa, porque meu marido trabalhava, como advogado para a Cúria. Então ficou fácil pedir-lhe, porque em minha casa conversávamos muito sobre o Espiritismo
E realmente, Dom Paulo Rolim Loureiro abriu o nosso Livro de Ouro com a quantia de 200,00 (não me lembro a moeda da época, se era cruzado ou cruzeiro), mas era uma quantia considerável, que só o nosso querido Zito e mais umas duas pessoas contribuíram assim.
Depois passamos a visitar consultórios de médicos conhecidos para pedir-lhes contribuição, e verdade seja dita, todos a quem pedimos contribuíram bastante.
Mas, há sempre um mas, houve um médico que eu conhecia desde menina pequena, que chegou a cuidar de nós, de meu pai, quando teve varíola, e quando lhe pedimos ajuda ele esbravejou, expulsou-nos da sua sala aos gritos, diante de uma sala de espera cheia de pacientes que aguardavam a vez, e dizia:
“É o cúmulo do atrevimento vir pedir-me colaboração para um Lar de
velhos, espírita, a mim, um católico”
Eu, envergonhadíssima, tentei falar-lhe: “Mas o Dom Paulo...”
E ele, aos gritos:” Não quero saber de nada. Retirem-se daqui”
Saímos apressadamente e já na rua, respiramos profundamente. A Ester queria morrer de vergonha, a Jacy, mais desinibida, ergueu a cabeça e perguntou a quem seria a nossa próxima visita. Já havíamos programado visitar um outro médico que ficava a uma quadra dali.
Agora, já não tão inseguras, mas ainda com o coração aos saltos, pedimos ajuda a Deus enquanto subíamos as escadas. Este médico também foi muito mau educado conosco, pelo mesmo motivo: ele era católico.
Visitamos aproximadamente, uns dez médicos e muitas outras pessoas que nunca se recusaram a contribuir, porque sabiam que não era uma obra doutrinária, de uma religião, mas uma obra social importante para a cidade.
Ficou-nos uma lição desta fase: como o preconceito religioso ainda era forte, naquela época, nas mentes pequenas, como sempre acontece.
Felizmente, hoje, parece-nos que não existe mais.
Para completar o caso, na inauguração do Lar dos Velhinhos, Dom Paulo, que fora convidado, mas em virtude de outros compromissos não pode comparecer, enviou o Padre João, seu assessor direto para representá-lo e até fazer um pequeno discurso.
Um abraço a todos !